quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Está tudo bem, viu?





A pessoa aqui é tão sem tempo e tão enfurnada na toca que as prosas mais longas que tem são com a moça que tem um bar/padaria do outro lado da minha rua. Não sei se dou risada ou choro com essa verdade, mas não vem ao caso - o ocorrido é: ela sabe que sou mãe de 3 pequerruchos. Normalmente, eles me acompanham, aos trancos e barrancos, na nossa aventura para comprar pão pro lanche da tarde. Ela acha a Lívia linda e o Muel super simpático. Dá balas para os dois, que chegam em casa e já brigam pelas balas IDÊNTICAS que ganharam. Enfim, isso também não vem ao caso. O fato é que, hoje, quando fui comprar umas porcarias para amenizar minha IRA do dia de hoje, ela percebeu minhas respiradas fundas enquanto eu pegava salgadinhos.

-Dia difícil, querida?
-É...
-Sabe que, eu nem sei seu nome, mas eu acho que você tem uma boa energia. É difícil ser mãe e seus filhos têm uma aura bem amorosa. Sei que você é casada mas deve fazer todo o trabalho do dia a dia sozinha, né? Cansa. Cansa só ser mãe às vezes, né? Ás vezes a gente esquece que é mais do que mãe. E dá uma exaustão. Mas olha, eu vejo você sempre por aqui, levando seus filhos com sorrisos e paciência pra cima e pra baixo e posso dizer que você está fazendo um excelente trabalho. Eles devem dar trabalho às vezes, mas a essência deles está aí, eles olham pra você nos olhos, falam, respondem, gostam, não gostam também. Está tudo bem viu. Eles são ótimos. Você é ótima.

Não vou dizer que chorei, mas vou dizer que tive que me segurar muito. Tive vontade de abraçar a moça, mas só abri um sorriso de alívio e de agradecimento. Ás vezes dá a impressão que a gente está sob eterno julgamento (bom, não é impressão, muitas vezes...), e quando chega alguém total avulso out of the blue e te acaricia com palavras doces, você renova a fé na vida, no mundo e em si mesma.

Obrigada, moça.

sábado, 20 de agosto de 2016

Quem tem poder na sua vida?

Todos os dias úteis, a perua do meu filho passa às 5:40h da madrugada para levá-lo à escola. Ou seja, a mamãe coruja aqui, em um estado zumbi eterno, coloca o despertador às 5:15h para entregar o Samuel ao tio da carona no horário combinado.

Como sou filha de uma filha de suíços, não curto nem um pouco atrasar os outros. Então, sou extremamente sistemática para não falhar nesse compromisso.

No entanto, como tudo na vida, às vezes as coisas não saem como gostaríamos.



Certo dia, eu simplesmente não ouvi o despertador. E quando acordei, eram 5:45h. Imagina minha reação. Sim, foi absolutamente repleta de desespero. Parecia que eu tinha que tirar o pai da forca. Nunca catei meu menino da cama e o troquei tão rápido. Provavelmente bati algum recorde mundial. Xingava, muito. Não conseguia acreditar como eu poderia ter dormido, e estava corada de vergonha antes mesmo de encarar o moço da perua.



No portão do meu prédio, jazia o ajudante do perueiro com cara de pouquíssimos amigos. Eu tremia de nervoso e nem conseguia encará-lo. Entreguei o Samuel aos cuidados dele, pedindo desculpas atrás de desculpas, como se eu tivesse cometido um crime. Ele nem sequer me respondeu. O tio da perua repetia, grosseiramente, que estava muito atrasado e que o horário existia para ser cumprido.

Voltei para casa devastada. Parecia que eu tinha acabado de condenar minha alma. Deitei na cama, meu marido, sonolento, perguntou se eu estava bem. Eu expliquei a situação que eu havia acabado de viver e ele, certeiro, disse:

-Meu amor, e daí que você se atrasou? Acontece com todo mundo. Não é o fim do mundo, ninguém morreu por causa disso, tá todo mundo com braço, perna, saúde, casa e comida. Todo mundo vai seguir vivendo de boa. Então, relaxa e dorme.

Naquele momento, o óbvio nunca ficou tão claro: por que raios eu estava tão nervosa? Realmente, não era nada aquela situação, era algo que eventualmente aconteceria e nada disso me condenaria a uma pessoa ruim. Então, qual era o meu problema?

 Era muito simples: descobri que eu tinha uma relação doentia com a opinião alheia. Descobri ainda mais que isso não era algo novo, vinha de longa data, tipo, desde meu nascimento, possivelmente. E ao reconhecer isso, nunca me senti tão idiota. Caraca, por que vivi colocando os outros num pedestal? Por que o que eles pensariam de mim era tão importante?

Porque assim dita o senso comum e normalmente, o senso comum é ensinado em todos os lugares - e a maioria leva para a vida.

E lá estava eu, levando para a vida e dando meu reinado para ele.

Percebi que em muitas situações essa sensação se repetiu: quando me descobri grávida do Pablo, entrei em depressão porque ficava IMAGINANDO o que MINHA FAMÍLIA pensaria de eu ter engravidado quando a Lívia estava com apenas 7 meses. A pessoa tem que ser muito besta de colocar a opinião de outras pessoas acima da própria - pessoas essas que por mais amor que tenhamos, não moram conosco, não pagam nossas contas, não estão na nossa certidão de casamento.

Então, às 6:15h da manhã, deitada na minha cama refletindo sobre isso, DECIDI que não iria mais levar merda nenhuma de sensação de "sou pior do que os outros" para comandar a minha vida. DECIDI que aquela seria a última vez que daria poder aos outros. Parece uma puta bobeira - e realmente é. Mas vivi tanto tempo aprisionada por isso que era quase normal me sentir assim.

But not anymore. Ridículo é aos 33 anos, com 3 filhos e casada há 7 anos eu ainda give a SHIT para o que os demais pensariam de algumas situações que EU vivia. Dezenas de anos de terapia não me ensinaram isso - só quando comecei a meditar que certas respostas vieram á tona. O autoconhecimento sempre é a melhor das guias. Anote isso.

Moral da história: vamos viver as nossas melhores versões. E quando algo não seguir o plano, é apenas a vida nos dando um sacode de emoções, para nos relembrar que somos humanos e podemos escolher o que queremos sentir,

Obrigada despertador pela lição.




sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Um. Dois, Três.





"Você tem 3 filhos? Que coragem/bobagem/loucura [insira outro adjetivo negativo aqui]".

Sim senhor, eu tenho 3 filhos. Três. Isso, três filhos. T-R-Ê-S. Um, dois, três. Eu sei que você acha muito, mas era o que eu queria - não da forma que eu queria, mas aquilo que a gente não quer também calha de aparecer nos trilhos da vida, o que podemos fazer? Aceitar, né? E está tuuuudo bem, mesmo. Então aceitamos de bom grado. Obrigada, obrigada!

Esses dias uma amiga postou no Facebook um quadrinho feito pela Chaunie Brusie e traduzido pelo Hypeness que me fez pensar nas questões do tratamento social que mães e pais recebem.




Claro que quando eu li isso, super me identifiquei. E muito mais porque, quando saio com meus filhos, especialmente sozinha, recebo incríveis olhares de:

1)Nossa, essa não sabe o que é camisinha ou anticoncepcional;
2)Nossa, essa quer povoar o mundo sozinha;
3)Nossa, outra que deve depender do namorado/marido/pai das crianças;
4.)Nossa, acabou com a vida dela, tadinha;
5.) Nossa, essa não tem internet nem TV em casa;
6)Nossa, essa sabe segurar homem;
7)Nossa, e depois favelada quem tem filho à toa;
8) Nossa, quer abrir uma creche.
9) Todas as alternativas.


É uma infinidade de especulações sobre as razões da mulher ter se tornado mãe, mas o mesmo preceito não cabe ao homem. Quando nós todos saímos de casa com o meu marido, os olhares dirigidos à minha família eram de:

1)Aaaah, que família linda;
2)Ahhh que fofura, o homem carregando a filha;
3) Aaaah, que mãe de sorte de ter um homem presente em casa;
4) Aaah que filhos lindos, puxaram o pai;
5.)Todas as alternativas mais outras qualquer realçando como eu tenho sorte por ter um marido ao meu lado.

Olha gente, eu amo meu marido. De verdade, ele é um cara maravilhoso, mas esse pensamento barroco de que eu, como mulher, só sou completa, útil e necessária para a sociedade POR CAUSA do meu companheiro é um troço que não consigo entender. Por que eu andando sozinha na rua com meus filhos (sim, no plural) QUER DIZER QUE sou sozinha, uma coitada, uma largada e irresponsável? Desde quando a mãe virou um padrão misógino desta forma?

Bom, certamente vem de longa data, já que o mundo é regido por alguns parâmetros bem machistas.

O negócio é: ser mãe já virou um negócio imaculado (a partir da concepção, você está fadada a ter os maiores medos e culpas da sua vida, e mesmo os camuflando com sorrisos e fotos no Instagram, ainda será interruptamente julgada por todos eles, por pessoas que, pasmem, normalmente nem pais são) - mãe de mais de um filho recebe um tratamento ainda pior, como se a quantidade dos filhos fossem dependente e diretamente ligada a forma que eles vão crescer (na maioria das vezes, pela votação geral, como um bando de bostas acéfalas e mal educadas). Afinal, na cabeça delas, um filho é difícil, dois é mais ainda e três é, não só impossível, como um atestado de irresponsabilidade, porque afinal, que mãe que consegue cuidar e criar de 3 filhos? Ah sim, nossas mães e avós. Mas naquela época era outra coisa, hoje é um Deus me livre. Né? Não.

Eu faço tudo sozinha - quando engravidei da minha filha, minha segunda gestação, eu estava empregada, mas como grande parte das profissionais que se vêem grávidas, fui convidada à me retirar logo depois da minha licença.Ali senti como o mercado de trabalho se fechou ainda mais para mim. Quando tive meu terceiro, então, virei um repelente ambulante de vagas. E assim, fui forçada a ser mãe 24h e dona de casa.

Hoje estou em casa, insistindo na volta à minha profissão, faxinando com o melhor humor que conseguir ter e cuidando da minha cria da melhor maneira que consigo. Porque digo, óbvio que não é easy task. Tem dias que não durmo mais de 4 horas e nem consigo tomar banho antes da meia noite. Comer então é uma raridade. Mas mesmo assim, estamos na luta da ação diária de "vamos fazer o melhor que pudemos com o que tivermos". Eu acredito que a vida só muda quando a gente muda, então, vomitei os desaforos e desfilo minha vida de mãe para engrandecer todas as mães que se sentem fuziladas pela sociedade patriarcal que querem fazer com que a gente se sinta mal pelas nossas próprias decisões. Digo, manas: vocês não estão sozinhas. Já somos completas por sermos o que somos. Mulheres que são mães e que calham de ter ou não companheiros/as.

Já somos inteiras. E está tudo bem com isso.