sexta-feira, 4 de março de 2022

Sabonete, xampu e prantos



Há algo de errado.

Parece que sempre há algo de errado. Comigo, normalmente. Totalmente. Completamente. Sim, comigo. Um dia após o outro, a sensação de falha, de falsa, de febre em lugares sombrios do meu pensamento. De ardor por uma vida que não me pertence porque não há possibilidades de eu ser do jeito que eu gostaria de ser.

E como eu gostaria de ser? Leve. Talvez livre, de uma liberdade de saber o significado dos seus propósitos existenciais e se gratificar com isso. Apaixonada por mim mesma. Pelos outros eu já sou; por mim mesma, é insustentável, dados os meus erros que viram atributos e os demais atributos servem apenas de descaso de copo.

E a maternidade só serviu para eu seguir apaixonada pelos outros (filhos) e substituir o Eu pelo nós, sendo que este nós tem uma porcentagem bem baixa de…Mim.

Não se engane, eu amo meus filhos. Mas não amo a maternidade. Não amo essa obrigação quase genética em não se permitir ser humana. Mas há o dever e principalmente, o querer de criar criaturinhas pequenas a virarem pessoas leves e livres, como poucas vezes na vida eu fui, e me recordo, é bom. Quero esta sensação para eles, vinda de todo respeito e amor por si mesmos e pelos outros.

É o que todos os pais querem. Alguns, mais que os outros. Alguns, trabalhando pra isso mais do que os outros. Mas a verdade é que não há um manual e assim, cada dia é um free style.

Hoje, como muitos, foi o meu. Por alguma bobagem, lá estava eu, carregando todo o fardo da maternidade sozinha. Por que a gente faz isso? É irracional. Não tem razão. Porque a gente, em teoria, não está sozinha, mas faz a maior parte da corrida sem ajuda, sem ninguém ter ensinado como ser mãe, a alimentar os filhos, a instruí-los, a, de fato, participar de sua criação no cotidiano, saciando suas necessidades.

Por isso digo que há algo errado em mim. Grandemente. Ou sou uma máquina. Não, não sou. Máquinas não sentem sono e meu maior desejo nesta vida é dormir por umas 12 horas seguidas. Ou a maternidade nos implica a sermos 100% disponíveis e inabaláveis, quando no fundo (e na superfície) somos apenas mulheres com muito peso nos ombros.

Carregar o mundo nos ombros é como respirar.

É o que toda mulher sabe fazer, ou aprende a fazê-lo, sem o menor entusiasmo — se bem que algumas, também, aprendem a desfrutar os passos pesados como um sinal de força; a maioria, no entanto, apenas se conforma e se acostuma — embora entorte sua perspectiva da vida e obrigue seus passos a diminuírem o ritmo: parar nunca fora uma opção.

Parece que eu me conformei, ou uma parte de mim se adaptou a isso e a outra ruge sua fúria em longos banhos com sabonete, xampu e prantos.

Aliás, está na hora do meu.

Quando será que as mães serão mais de si mesmas de novo?

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